A MÃE DAS PSICOTERAPIAS
Essa psicoterapia, que também é uma teoria sobre o funcionamento psicológico – uma invenção do Freud – é diferente e deu origem às outras, porque valoriza a interpretação do conflito inconsciente e a análise da transferência que tende a resolvê-lo.
Nesse tipo de tratamento, são utilizadas, para discussão prática, para ilustrar e apresentar os conflitos internos, também coisas que acontecem no relacionamento entre o analista e o analisando. Essa maneira de mostrar o que acontece com o seu mundo emocional, no momento da sessão, ao vivo e em cores, torna muito mais prática, muito mais viva, a percepção que o paciente tem de si próprio. Origina o que chamamos de “insight”.
Essa palavra inglesa, cuja tradução poderia ser, compreensão vivencial, está na base, na origem de toda mudança mais ou menos persistente de comportamento. Um insight é uma vivência de compreensão especial, uma “sacada”, uma entrada na realidade psicológica própria, que estava mais ou menos escondida e da qual não se conhecia detalhes.
Decorre de uma interpretação diferente de determinada realidade a que estávamos acostumados.
Em Psicanálise, chamamos de “interpretação” a uma comunicação feita pelo analista a uma pessoa, procurando fazê-la aceder a um sentido latente, um sentido que não está aparente, está escondido, mas que existe nas entrelinhas de suas palavras e também em seus comportamentos.
Entre muitos exemplos que poderiam ser dados, vou utilizar um para tentar descrever de forma muito singela, o que é um insight, mesmo correndo o risco de simplificar demais a questão. O que for insuficiente poderá depois ser preenchido com outros complementos.
Observe a seguinte seqüência de números: 170.320.232.113 Olhada desta forma, como lhe foi apresentada, a seqüência numérica não tem um significado especial, forma apenas um outro número, maior que qualquer um dos algarismos que o formaram: cento e setenta bilhões, trezentos e vinte milhões, duzentos e trinta e dois mil, cento e treze.
Quando, porém, esse número é reordenado, de acordo com outro tipo de percepção, outro arranjo, adquire um sentido especial, que já existia no primeiro, porém não estava de todo consciente por quem pela primeira vez o observou:
17/03/2023 – 21:13
Imediatamente passamos a enxergá-lo de uma forma diferente. Pleno de significado, aquele número deixa de ser um número qualquer. Neste caso específico, passa a ser a representação de uma data e um horário. Para mim, então, esta data significa o dia, o mês, o ano e o horário em que estou revendo este trecho.
Isto é um insight. Se eu o estivesse vendo pela primeira vez, tendo uma nova compreensão do fato, da determinada estrutura que passou a adquirir um significado novo a partir da utilização de uma percepção diferente da que sempre foi por mim usada para sua compreensão, eu estaria tendo um insight.
O objetivo de toda análise psicológica é proporcionar insights sobre sentimentos, pensamentos e comportamentos corriqueiros. A partir desses insights a pessoa pode conseguir encontrar forças para mudar eventuais comportamentos patológicos ou determinados comportamentos que a estão incomodando, mesmo que não sejam sintomas de doença, e encontrar novas dimensões de seu existir.
Vai se modificar porque alguma coisa interna mudou, sua personalidade se enriqueceu, a ela foi acrescentada nova percepção sobre sua vida.
Observe que na definição de insight coloquei o adjetivo vivencial para frisar que não se trata apenas de uma compreensão racional, intelectual. Os insights mais interessantes e importantes vêm geralmente acompanhados por uma carga afetiva intensa, uma energia afetiva, emocional, que se libera naquele momento. A pessoa ri, chora, sente-se iluminada, extasiada ou qualquer outra forma de emoção.
Essa compreensão vivencial, na psicoterapia, se dá com a presença de uma pessoa e por causa dela: geralmente o analista, apesar de não ser exclusivamente dentro de uma relação de análise que é possível se ter insights.
A psicanálise é um processo facilitador de insights, quando outras maneiras de consegui-los, no convívio com a arte, por exemplo, como já comentado em outro capítulo, estão parcialmente bloqueadas.
O ambiente onde é feita a psicoterapia, o consultório do analista, por ser mais simples, mais protegido, com menos coisas estimulantes, pode facilitar e muito a percepção do que se passa entre os dois. Sim, porque o insight na relação analítica, geralmente se refere a alguma coisa acontecida no relacionamento com o analista, que, no fundo, decorre de uma repetição de padrões de conduta do paciente com outras pessoas importantes da sua vida, o que se chama de “transferência” na teoria psicanalítica.
A compreensão dos motivos íntimos, mais verdadeiros, que estavam inconscientes e que explicam definitivamente seu comportamento, funciona como um núcleo gerador de mudanças no jeito de ver e, portanto, de estar no mundo. O insight do analisando vai contribuir para a reorganização de alguns aspectos da sua personalidade e para a dissolução progressiva dos sintomas que o estavam incomodando.
Vejam que estou falando, então, de uma ajuda psicológica através da convivência com outra pessoa.
Essa é a minha proposta sempre: reexaminar, retomar, explicar a ajuda, através da convivência, individualizando o contexto das situações existenciais, o que é completamente diferente do que se convencionou chamar de “auto-ajuda” que é uma forma simplória – muito mais sujeita a equívocos – de se adquirir conhecimento psicológico.